EUA quer reconhecer Crimeia como parte da Rússia para impulsionar negociação de paz na Ucrânia
O jornal Washington Post noticiou nesta terça-feira (22), que a Casa Branca propôs reconhecer a Crimeia como parte da Rússia e congelar a linha de frente, como forma de facilitar a negociação de um acordo de paz na Ucrânia, que será realizada amanhã em Londres. Europeus e ucranianos esperam obter garantias de segurança e planos de reconstrução para o país em troca de concessões territoriais. A proposta dos EUA, apresentada à Ucrânia em Paris, na semana passada, inclui o reconhecimento formal da anexação da Crimeia como território russo e, eventualmente, o levantamento das sanções à Rússia em um futuro acordo. Moscou, por sua vez, encerraria as hostilidades no momento em que suas tropas avançam no campo de batalha.
Um assessor do presidente ucraniano, Volodmir Zelenski, disse que a proposta americana incluía algumas ideias com as quais Kiev concorda. Uma autoridade ocidental afirmou que os termos do acordo proposto e as concessões da Ucrânia eram “surpreendentes” Todos falaram sob condição de anonimato, para poder discutir temas sensíveis. Um funcionário do Departamento de Estado dos EUA minimizou o fato de o plano ter sido apresentado como um pacote fechado. Os ucranianos, no entanto, temem novos atritos com Donald Trump, cada vez mais frustrado com o ritmo das negociações.
Franceses, britânicos e alemães, que estão organizando o encontro em Londres, pedem que qualquer acordo inclua garantias de segurança e programas de reconstrução pós-guerra, possivelmente pagos em parte com ativos russos congelados. Nos bastidores, autoridades europeias e ucranianas reconhecem que é improvável a retomada dos territórios ocupados pela Rússia Na melhor das hipóteses, eles esperam atrasar qualquer acordo que levante as sanções aos russos antes obter alguma vantagem para a Ucrânia.
O Financial Times publicou nesta terça que a Rússia aceitaria manter os territórios que já ocupa dentro das quatro províncias que pretende anexar. O que, dentro dessas províncias, estiver em controle ucraniano, permaneceria assim. A proposta teria sido feita por Putin ao enviado de Trump Steven Witkoff. “Existe a preocupação de que Trump não tenha sido suficientemente duro com a Rússia”, disse Mujtaba Rahman, diretor do Eurasia Group, uma consultoria de risco político. “A questão agora é o que a Ucrânia receberá em troca de abrir mão de parte de seu território.”
Os EUA apresentaram o esboço a proposta à Ucrânia em Paris. Na ocasião, o secretário de Estado, Marco Rubio, ameaçou se retirar da mediação caso não houvesse progresso em breve. Como sinal da frustração dos EUA, Rubio cancelou sua participação na negociação de Londres. A proposta dos EUA veio depois que o enviado de Trump, Steve Witkoff, visitou Moscou para uma reunião com o presidente russo, Vladimir Putin, no dia 12. Espera-se que volte à Rússia no fim de semana. Um dos diplomatas informados sobre a negociação descreveu o plano como “a ideia de Witkoff”.
A proposta será difícil de ser digerida pela Ucrânia. A anexação da Crimeia, em 2014, foi o alvo de abertura da guerra e foi seguida da separação arquitetada pelos russos das regiões orientais de Donetsk e Luhansk, que precederam a invasão em grande de 2022. “Se o que está relatando for verdade, é triste e perigoso”, disse a deputada ucraniana Ivanna Klympush-Tsintsadze. “Isso significa que os EUA não estão buscando uma paz justa e duradoura, mas sim algum tipo de trégua temporária às custas de concessões ao agressor – e apresentar isso como uma grande conquista dos EUA.”
Zelenski nunca desistiu da meta de um dia retomar a Crimeia, mas admitiu suas limitações militares. “Não temos forças suficientes”, disse o ucraniano, no ano passado. “Precisamos buscar meios diplomáticos.” Os líderes europeus tentar usar sua influência em favor da Ucrânia. A Europa tem poder de influência, incluindo bilhões em ativos russos congelados que poderiam ser devolvidos ou usados para financiar programas de reconstrução pós-guerra. “Os europeus têm cartas reais para jogar”, disse Rahman. “Se não houver alívio das sanções por parte da UE, apenas dos EUA, os benefícios econômicos para a Rússia serão marginais.”
Um diplomata da UE, familiarizado com a proposta dos EUA, disse que as expectativas permanecem baixas para a rodada de negociações em Londres. “Cabe aos ucranianos decidir se esses termos são razoáveis”, disse. Sob pressão dos EUA, tanto a Rússia quanto a Ucrânia sugeriram que estariam abertas a negociações diretas enquanto Donald Trump cobra um acordo. Embora tenham mantido contato nos bastidores, por meio de intermediários, Moscou e Kiev não discutem diretamente o fim do conflito desde que os esforços iniciais para a paz foram abandonados, ainda no começo da guerra.
Zelenski disse nas redes sociais que a Ucrânia está pronta para qualquer conversa sobre um cessar-fogo que interrompa os ataques à infraestrutura civil. Dmitri Peskov, porta-voz do Kremlin, afirmou que havia nuances na proposta ucraniana que fazem sentido discutir com Kiev. Peskov disse que ainda não há planos concretos para negociações diretas entre Moscou e Kiev, mas a incomum troca pública indica que os dois lados estariam interessados em pelo menos parecer dispostos a negociar, especialmente diante da insistência de Trump.
No domingo (20), o presidente americano disse esperar que a Rússia e a Ucrânia fechassem o acordo esta semana, acrescentando que os Estados Unidos poderiam lucrar muito com isso. A Ucrânia havia concordado com a pausa de 30 dias nos ataques proposta por Donald Trump, mas a Rússia negou, apresentando novas exigências. O resultado desses esforços foi uma trégua frágil e limitada. Mais recentemente, Vladimir Putin anunciou um cessar fogo de Páscoa, que os dois lados se acusaram mutuamente de violar.
*Com informações do Estadão Conteúdo
Publicado por Victor Oliveira