Opinião: a máquina de moer sonhos

Los Hermanos, em uma de suas célebres músicas, anunciava: “todo Carnaval tem seu fim”. E findo o ‘carnaval’ de 45 dias do pleito eleitoral, seguimos com nossa vida normal (nós jornalistas, servidores públicos municipais, policiais, dentre outros). Aqui deixo uma impressão sobre este período.

Foto: Aloisio Maurício / Foto Arena / Estadão Conteúdo

A participação dos eleitores em Sete Lagoas foi expressiva: mais de 80%. Em um pleito polarizado entre Douglas Melo (PSD) e Júnior Sousa (PRD), o que ouvíamos das pessoas eram seus argumentos para não votar em um e outro, mostrando que a rejeição seria um dos fatores para a escolha do candidato. As eleições, em algum momento, são épocas em que “verdades” aparecem, mas nem sempre o cidadão aceita essa opinião. Como exemplo temos a pesquisa Datatempo, encomendada por Júnior Sousa, apontando que o setelagoano já tinha feito sua escolha e não pretendia mudar seu voto.

Mas apesar da polarização, um “outsider” apareceu para mostrar que existe uma parcela da cidade que não está satisfeita com os nomes ali apresentados: Juninho Sinonô (Novo), que se dizia “o Pablo Marçal de Sete Lagoas”,  foi o mais combativo dos candidatos, conquistando 21 mil votos. Curiosamente, ele comentava que o seu parceiro de chapa, o contador Saulo Calazans (Novo), era até melhor do que ele no pleito e que não queria disputar uma reeleição caso ganhasse. É bem claro que Saulo é uma força política na cidade, conquistando mais votos que na eleição passada (2020), onde foi o postulante a prefeito. Admirado e cordato, ele é um caso onde até quem tem orientação política diferente fala: “gostaria de votar nele”.

Domingo tranquilo

De acordo com a Polícia Militar, apenas uma boca-de-urna foi registrada na cidade. Foi um dia tranquilo de votações, onde a maioria preferiu ir cedo para as sessões para aproveitar o domingo com cerveja, churrasco, tira-gosto, entre outros. A decisão de não ter lei seca durante o pleito é uma decisão acertada, não pensando nos bares, mas na população, que não gosta de política em sua maioria, mas quer aguentar um dia “chato” bebendo, seu único lazer acessível.

Tranquilo também foi o recebimento das mídias no Cartório Eleitoral de Sete Lagoas. Como os resultados foram bem mais ágeis que na eleição passada, não se viu presença de assessores de candidatos (apesar de um e outro irem por lá). Os bravos servidores e voluntários esperavam ansiosamente para entregar as mídias de votação, enquanto as urnas chegaram tempos mais tarde, onde uma nova força-tarefa fez o dever de armazená-las no subsolo do prédio público.

O telefone tocou por volta das 19h: era um assessor do agora eleito prefeito Douglas Melo relatando sobre a coletiva que ele iria conceder no comitê de campanha, na Rua Dr. Pena. Chegando até lá, trabalhadores da campanha ouviam no rádio a apuração enquanto aguardavam o resultado.

Foto: Filipe Felizardo

Como estava quente naquele lugar e na cidade.

“Demonstrar virtude é um fenômeno da internet, e durante as eleições isso fica mais claro. Porém, o que poucos lembram é que os apoios ‘silenciosos’, daqueles que não vivem vociferando por aí em rede social é que decidiu a eleição”

 

Da chegada até a confirmação da vitória de Douglas e sua chegada foram mais de uma hora. A Polícia estava lá para impedir o fechamento da via, mas o povo estava fazendo sua festa movidos à água mineral. Com a espera entediante (e duas participações ao vivo na transmissão do SeteLagoas.com.br da apuração) ma Hilux apontou na subida da rua: o secretário de Meio Ambiente Edmundo Diniz trazia o candidato eleito, o prefeito Duílio de Castro (PSB) e o “velho-novo” vice Dr. Euro (Rede). Eles desceram do carro e os apoiadores vieram.

Entrando de mãos dadas no comitê, os políticos queriam mostrar para todos que a união fez a vitória. O atual chefe do executivo é bem avaliado, de acordo com as pesquisas, e foi papel crucial para o triunfo de Douglas. Parecia carnaval: música alta, gente vibrando suada, papel voando para o alto, euforia. Em cima de cadeiras, o prefeito eleito discursou junto com Duílio, Dr. Euro e Juca Bahia, ex-chefe do executivo em Paraopeba.

Foto: Filipe Felizardo

Fizemos uma live rápida com as primeiras impressões de Douglas. E tinha muita gente nos comentários dizendo “eu não votei”, “essa culpa eu não carrego”. Demonstrar virtude é um fenômeno da internet, e durante as eleições isso fica mais claro. Porém, o que poucos lembram é que os apoios “silenciosos”, daqueles que não vivem vociferando por aí em rede social é que decidiu a eleição.

Trabalho em eleições

Enquanto estava aguardando a chegada do novo prefeito, uma amiga que trabalhou na campanha se aproximou. Ela, que votou em Douglas convictamente por não acreditar nos outros candidatos (apesar de uma leve predileção a Jamilton Santos (PT), que teve pouco mais de 4,5 mil votos), comentava que era a primeira e a última vez que iria atuar num período eleitoral. Um assessor, durante as conversas sobre a cobertura eleitoral, confidenciava: “eu tô torcendo para que 6 de outubro chegue logo”.

“Por isso acho que a eleição é uma máquina de moer sonhos: aquele que entra cheio de ideais sai traumatizado; aquele cheio de energia está mais que esgotado”

O leitor deveria, caso nunca tenha tido a experiência, reparar mais perto no funcionamento de uma campanha eleitoral. Apesar das ideologias, programas partidários, afinidades, entre outros, este é um processo pragmático. Se obedecer a todos eles, é possível que você tenha sucesso. Quem trabalha pela primeira vez e retorna para mais uma é um forte. Convencer alguém de dar seu voto não é só difícil, mas é algo ingrato. Por isso acho que a eleição é uma máquina de moer sonhos: aquele que entra cheio de ideais sai traumatizado; aquele cheio de energia está mais que esgotado.

Esgotados parecem os eleitores, tanto é que a campanha dura oficialmente 45 dias. Se tivesse mais tempo, talvez a abstenção seria maior e até os candidatos perderiam o fôlego para tentar convencer mais gente. A única coisa divertida (questionável, já que é uma tradição brasileira tratar a disputa irracionalmente) é a piada. Se a banda Lambasaia não tiver sido um dos grupos mais escutados no Spotify, eu mudo de nome. “Acabou, acabou, acabou…”, música que se ouviu ontem, dentre os outros tipos feitos por eles. É o alívio cômico.

E como “acabou”, vamos voltar para nossa rotina. Daqui a dois anos, teremos mais um ‘carnaval’ a requintes de entrudo. Estejamos preparados.

Filipe Felizardo é jornalista no SeteLagoas.com.br

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